RESUMO EXECUTIVO
Via CSF
Neste estudo, avaliamos a viabilidade do mercado de Cotas de Reserva Ambiental no estado do Maranhão em diferentes cenários de restrição de trocas. As cotas, definidas como “um título nominativo representativo de área com vegetação nativa, existente ou em processo de recuperação” (Lei No. 12.651, 2012), foram instituídas pelo novo Código Florestal para facilitar a adequação dos proprietários rurais à legislação ambiental. De acordo com o Código Florestal anterior, criado em 1965, os proprietários deveriam manter uma parcela percentual da propriedade rural em áreas de vegetação nativa — denominadas Reserva Legal. O novo Código Florestal mantém este requerimento, mas permite que proprietários que não possuíam áreas de Reserva Legal em suas propriedades até julho de 2008 possam comprar Cotas ao invés de recompor áreas de vegetação nativa.
No entanto, a implementação e viabilidade do mercado de cotas ainda enfrentam desafios. Apesar de definir regras gerais para o funcionamento do mercado de Cotas, o novo Código Florestal não regulamenta o mecanismo. Por exemplo, a legislação não especifica a duração do título (i.e., da Cota de Reserva Ambiental). Como resultado, a maioria dos estados brasileiros ainda não implementou o mercado de Cotas. A expectativa é a de que os estados, incluindo o estado do Maranhão, aguardem a regulamentação do mecanismo pelo governo federal para então avançarem com a implementação das Cotas (Gasparinetti & Vilela, 2018)1. No entanto, de acordo com o governo federal, cabe aos estados definirem os critérios que serão utilizados na implementação e funcionamento do mercado de Cotas.
Uma vez estabelecidos as diretrizes federais e o mercado, os estados serão responsáveis pelo monitoramento e deverão decidir se restringirão o mercado a determinadas áreas de interesse. Por exemplo, os estados podem exigir a compra de Cotas de áreas prioritárias ou não permitir a compra de Cotas de propriedades localizadas dentro de Unidades de Conservação (Chiavari & Leme, 2017). O objetivo de limitar as transações de Cotas de Reserva Ambiental seria o de garantir adicionalidade ambiental ao mercado. A compensação em áreas localizadas em Unidades de Conservação, por exemplo, não aumenta a extensão de áreas preservadas e, por esta razão, o mecanismo, como estabelecido por lei, não gera adicionalidade. Neste sentido, para ampliar as áreas de vegetação nativa protegidas, o estado deveria criar requisitos de compensação de Reserva Legal mais restritivos do que os determinados pelo novo Código Florestal (Chiavari & Leme, 2017).
A discussão sobre priorização de áreas é importante também dada a reinterpretação, no início deste ano, do § 2º do novo Código Florestal pelo Supremo Tribunal Federal2. De acordo com os ministros, as áreas a serem comercializadas no mercado de Cotas devem ter a mesma Identidade Ecológica. Tal interpretação, no entanto, tem gerado inúmeros debates. A novo Código Florestal não faz qualquer menção ao conceito de Identidade Ecológica, sendo, portanto, um termo, até agora, bastante abstrato.
Dentro deste contexto, este estudo procura contribuir para a discussão sobre Identidade Ecológica e para o processo de decisão ao analisar a viabilidade do mercado de Cotas de Reserva Ambiental no estado do Maranhão em quatro cenários. No primeiro cenário (de referência), restringimos as transações às áreas localizadas no mesmo bioma e excluímos a possibilidade de troca de áreas localizadas em Unidades de Conservação. Nos três cenários alternativos, além das restrições mencionadas acima, impomos as seguintes restrições adicionais às áreas transacionadas:
• Cenário alternativo 1:
o As transações são restritas às áreas com mesmo grau de prioridade
• Cenário alternativo 2:
o As transações são restritas às áreas localizadas na mesma ecorregião
• Cenário alternativo 3:
o As transações são restritas às áreas localizadas na mesma sub-bacia hidrográfica
Para cada um dos cenários, calculamos: (i) o preço e a quantidade de equilíbrio, e (ii) o custo de adequação. Para tanto, construímos as curvas de oferta e de demanda por Reserva Legal utilizando um modelo econômico de otimização. O preço e a quantidade de equilíbrio são identificados a partir da interseção entre as duas curvas.
Os resultados obtidos neste estudo sugerem que o mercado de Cotas de Reserva Ambiental é viável. No caso do bioma Amazônia, o preço de equilíbrio no cenário de referência seria igual a R$ 1.700 por hectare e a quantidade transacionada, 2,8 milhões de hectares. Com exceção de alguns produtores de gado, os demais proprietários rurais optariam por compensar seus déficits via mercado. A imposi- ção de restrições adicionais reduziria o número de participantes, mas ainda assim geraria ganhos financeiros para mais da metade dos proprietários rurais.
Com relação aos biomas Cerrado e Caatinga, temos que a dinâmica do mercado é bastante parecida nos dois biomas. No cenário de referência, o preço de equilíbrio seria R$ 100 por hectare e a quantidade transacionada seria 777 mil e 145 mil hectares respectivamente. O preço estimado em ambos os casos corresponde ao custo de oportunidade de determinados produtores de gado — que possuem o menor custo de oportunidade em nossa base de dados.3 Neste cenário, todos os proprietários optam pela compensação ao invés da recuperação (assumindo que quando indiferentes, os proprietários participarão do mercado). A imposição de restrições altera a dinâmica do mercado apenas no cenário alternativo 1 (áreas prioritárias) em função da redução do número de áreas disponíveis à comercialização no mercado. Neste caso, a quantidade transacionada seria 728 mil e 139 mil hectares nos biomas Cerrado e Caatinga. Como resultado desta restrição, uma parte dos proprietários não poderá participar do mercado e terão como única alternativa, a recuperação de áreas de reserva legal em suas propriedades.
Com relação especificamente aos custos de adequação, calculamos que o custo de adequação via mercado é sempre menor do que o custo de adequação via recuperação para a maioria dos proprietários rurais.4 A exceção são os proprietários de terra cuja atividade principal é a pastagem – atividade com menor custo de oportunidade.
Portanto, sob o aspecto financeiro, o mercado de Cotas de Reserva Ambiental geraria benefícios para a maior parte dos produtores rurais no estado do Maranhão. Considerando o aspecto ambiental, os resultados mostram que a imposição de restrições ao mercado de cotas – consistente com a reinterpretação da lei e com o novo conceito de Identidade Ecológica – não altera a viabilidade do mercado apesar de em determinados casos reduzir o número potencial de participantes. Tal resultado sugere que é possível conciliarmos desenvolvimento econômico e conservação ambiental. Para tanto, é preciso existir transparência e clareza na determinação das regras do mercado tanto no nível estadual quanto no federal.
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