Em Minas Gerais, iniciativa envolve diferentes atores para promover paisagens sustentáveis e a conservação de vegetação nativa
por Luana Luizy, Assessora de Comunicação, Instituto Internacional de Educação do Brasil
Companheiro que faz parte do cotidiano de milhares pessoas no mundo todo, o café é um produto de forte expressão na cultura mundial. No Brasil, o estado de Minas Gerais se destaca na produção desse grão, sendo, hoje, um dos maiores exportadores internacionais. Assim, a atividade cafeeira precisa ser desenvolvida com equilíbrio ambiental entre a fauna e a flora.
Dessa maneira, de nada adianta a produção do café sem pensar na sustentabilidade, já que esse produto exige um equilíbrio entre uma série de fatores ambientais, os quais perpassam um solo rico em nutrientes e forte irrigação para o cultivo desse grão. As ameaças climáticas representam hoje uma ameaça para o seu cultivo.
Com base nisso, o Consórcio Cerrado das Águas (CCA) surgiu em 2019, com o objetivo de envolver diferentes atores da cadeia produtiva do café numa plataforma colaborativa para restaurar a vegetação nativa e monitorar a qualidade da água dos rios e solos, a fim de garantir a produção sustentável de café e a gestão eficiente dos recursos hídricos na região do triângulo mineiro. Representantes de cooperativas, ONGs e grandes empresas, tais como a Nespresso, e a Lavazza, participam do Consórcio.
O objetivo da união desses diferentes atores foi o de assegurar a resiliência às mudanças climáticas que interferem nas bacias hidrográficas, restaurar a provisão de serviços ecossistêmicos, a partir do fortalecimento de corredores ecológicos – “áreas que unem fragmentos de vegetação nativa ou áreas protegidas que estão separadas por interferência humana”[1] –, e promover impactos positivos no Cerrado mineiro.
O produtor rural, Ricardo Bartholo, um dos beneficiários do projeto do CCA, comenta que a iniciativa fortalece a disponibilidade de água no Córrego Feio – manancial que abastece a população e também é usado para as atividades agropecuárias no município de Patrocínio, em Minas Gerais.
“O Consórcio veio trazer uma visão mais objetiva para nós produtores. É ótimo ver as grandes empresas atentas a sustentabilidade na produção do café. Eu tenho convicção de que nós teremos um aumento do manancial de água. Com isso posso utilizar mais água para irrigar a minha plantação de café, pois hoje tenho uma limitação da quantidade que posso extrair”, afirma.
Dentro da plataforma, as empresas da cadeia produtiva de café se comprometem a doar um aporte financeiro para a manutenção e o investimento das atividades de restauração da bacia hidrográfica. “A gente olha para a vegetação nativa, os recursos hídricos, a quantidade de água dentro das bacias, as paisagens conectadas, o envolvimento e as conexão dos produtores, o engajamento institucional e a comunidade local dentro dessa plataforma colaborativa que é o CCA”, explica Fabiane Sebaio, diretora-executiva do Consórcio Cerrado das Águas.
Investir no produtor
A atenção ao pequeno produtor também é um dos eixos de ação do Consórcio Cerrado das Águas, por meio do Programa de Investimento do Produtor Consciente (PIPC). “Esse programa começa com um contato com os produtores, para gente falar o que é o Consórcio; explicamos que a propriedade deles faz parte da bacia hidrográfica, o conceito da mesma, fazemos um diagnóstico e uma visita na propriedade dos produtores, também sugerimos se podemos investir em seu território, elaboramos um plano; a partir dele, marcamos uma oficina, onde discutimos com os processos”, diz Fabiane Sebaio.
O objetivo central do PIPC é estabelecer e implementar uma estratégia para restaurar a prestação de serviços ecossistêmicos na bacia, a longo prazo, através de um processo de envolvimento efetivo com produtores e atores locais. A maior preocupação do programa são as áreas de vegetação nativa, esclarece Fabiane: “Precisamos fazer o produtor entender que a sua propriedade está dentro da bacia e que toda e qualquer mobilização em prol da restauração e da qualidade de água da bacia é importantíssima. A gente considera o engajamento do produtor muito importante nesse processo. Onde eu preciso restaurar para ter uma efetividade nesse processo?”.
A meta do programa foi a de atingir 100 hectares, em sete municípios no Cerrado mineiro; uma das áreas escolhidas, a bacia do Córrego Feio em Patrocínio, é onde se encontra o pato-mergulhão, uma ave nativa do Cerrado ameaçada de extinção, que depende de ambientes aquáticos extremamente conservados para a sua sobrevivência.
Parceria com o Fundo de Parceria Para Ecossistemas Críticos
O Consórcio do Cerrado das Águas conta com o apoio do Fundo de Parceria para Ecossistemas Críticos (CEPF, Critical Ecosystem Partnership Fund) e do Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB) para ser executado, mas a grandeza do projeto lançou um desafio: o de promover a adoção das melhores práticas em agricultura no Cerrado de Minas Gerais e reunir empresas concorrentes da cadeia do café, todos em prol do mesmo interesse – a conservação de áreas nativas e dos recursos hídricos do Cerrado.
No entanto, todo o recurso investido não se limitou apenas à restauração, mas também ao diálogo com o produtor, ao desenvolvimento de um aplicativo que mapeia áreas degradadas, o esforço de reunir empresas concorrentes da cadeia do café. Assim, o recurso do CEPF e o apoio do IEB foram fundamentais no processo de construção da metodologia da equipe e do investimento nas propriedades.
“Nesse cenário de engajamento do produtor, é o maior legado com o projeto fazer esse movimento para que o produtor cuide mais da sua propriedade, para que haja uma mudança de mentalidade sobre o que é uma fazenda sustentável, como eu proporciono resiliência climática, o entendimento de que o clima reúne uma série de fatores e de que a lavoura desses produtores proporciona restauração”, explana Fabiane Sebaio.
Saiba mais sobre o Consórcio Cerrado das Águas: http://cerradodasaguas.org.br/
[1] “O que são Corredores Ecológicos”. Dicionário Ambiental. ((o))eco, Rio de Janeiro, ago. 2014. Disponível em: <https://www.oeco.org.br/dicionario-ambiental/28538-o-que-sao-corredores-ecologicos/>
O Fundo de Parceria para Ecossistemas Críticos é uma iniciativa conjunta da Agência Francesa de Desenvolvimento, da Conservação Internacional, União Europeia, da Gestão Ambiental Global, do Governo do Japão e do Banco Mundial. Uma meta fundamental é garantir que a sociedade civil esteja envolvida com a conservação da biodiversidade.